O artista uruguaio multimídia Fernando Velazquez concebeu a instalação “Iceberg – Antropobsceno”, no Parque Cultural Casa do Governador, conhecido como Parque das Esculturas, em Vila Velha (ES). A construção do projeto selecionado em edital da Secretaria Estadual da Cultura do Espírito Santo se viabilizou pela escolha do material, o Monopainel® – painéis monolíticos em poliestireno expandido (EPS).
“Caso a única opção fosse o concreto, chegaríamos ao dobro do custo e não poderíamos executar”, conta o arquiteto André Mafra, sócio do escritório Mafra Arquitetos Associados e co-autor do projeto, que trabalhou ao lado do engenheiro Sérgio Massao Adati e do paisagista Henrique Zanetta.
“Iceberg” é uma série de Velazquez que pode ser entendida como um mix de escultura, objeto de arquitetura e instalação interativa. Sua primeira versão foi apresentada na São Paulo Fashion Week 2018, com 11 m de altura, em madeira – pinus e compensado. Internamente, monitores revelam para os visitantes imagens fragmentadas de um iceberg. A próxima instalação deverá ser construída no Uruguai, em metal.
No parque de Vila Velha, a obra faz parte do acervo de caráter permanente. Simulando um iceberg, a estrutura tem uma única abertura, a porta de acesso ao público. Dentro do espaço, o visitante interage com a palavra “Antropobsceno” em neon vermelho. Essa luz, principalmente à noite, se destaca e destaca o edifício pintado de cinza, em meio ao parque.
“A ideia foi erguer um monolito de concreto ou de argamassa armada, que é o caso do Monopainel®. Em seu entorno, o paisagista Henrique Zenetta criou uma vegetação que, aos poucos, tomará a parte externa do edifício, tornando a instalação um objeto vivo”, relata Mafra.
CONSTRUINDO O “ICEBERG” COM MONOPAINEL®
A locação escolhida pelo poder público para a instalação no parque é uma subida que vai até o costão, relevo com diferença de 1 m entre a parte mais baixa e a alta. A equipe de obras escavou e nivelou o terreno, executou o radier e a estrutura em painéis monolíticos em EPS. “Internamente, aterramos novamente, deixando no mesmo nível do terreno em volta”, conta o arquiteto, acrescentando que o piso não recebeu qualquer revestimento, permanecendo em terra batida.
Dialogando com a imagem de um iceberg, a escultura em forma de triângulo tem 7 x 4 m e o objeto em si é distorcido num jogo de planos. A parede frontal, por exemplo, se inclina em direção à porta, enquanto a do fundo é reta, dando uma volumetria interessante.
“É uma estrutura pequena, mas, por sua altura e por esses planos variados dá a sensação de amplitude, além de forte presença no parque”, diz. No alto, a luz penetra no ambiente interno através de abertura zenital protegida por chapa acrílica.
“A instalação foi concebida para ser feita em concreto armado, mas o orçamento não fechava. Construi-la em EPS foi muito interessante”, conta Mafra que levou para essa execução sua equipe de obra sediada em Santos, litoral de São Paulo. Foram usadas 23 peças de Monopainel®, medindo 3,00 m x 1,80 m x 0,80 m, num total de 125 m², além dos acessórios. A densidade do EPS foi a 2 F, lembrando que o material é tratado com retardante a chamas.
As inclinações e a altura de 7 m deram mais complexidade à execução. Para atingir a precisão exigida pelos planos irregulares projetados, os painéis monolíticos foram cortados e montados no chão – trabalho muito parecido com a preparação de uma maquete 1 x 1.
“Felizmente, as duas paredes planas atuaram como eixo para conseguirmos erguer as demais e obter o prumo”, afirma Mafra, que continua: “Foi muito mais fácil trabalhar com o EPS do que com o concreto, que exigiria montar as fôrmas, armar a estrutura, concretar e proceder à desforma. Tínhamos tudo planejado para construir em concreto. Levaríamos dois meses, porém a obra ficou pronta na metade do tempo com o Monopainel®, desde a execução do radier até a conclusão”.
Fernando Velazquez se diz muito contente com a construção em EPS. “Foi uma solução que conseguiu resolver de maneira bastante prática e rápida o desafio, diante do tempo que tínhamos, com resultado de qualidade”, declara.
O artista e sua obra
O artista Fernando Velazquez lança mão do iceberg em sua obra para apontar que o ser humano, ao vê-lo, acredita estar conhecendo o todo, o que não corresponde à realidade. Afinal, 70% da massa desse elemento da natureza fica oculto. “O iceberg representa uma grande metáfora ao ser relacionada, como faço, com o que significa a tecnologia no mundo contemporâneo. A tecnologia é um iceberg e as pessoas só enxergam o lado positivo que é impulsionado pelo capital, vendedor de coisas. E ninguém se pergunta se realmente precisa delas”, diz, acrescentando: “O iceberg é um artifício para criar arte”.
A expressão que dá nome à instalação em Vila Velha, “Antropobsceno” responde às reflexões de Velazquez, entrelaçando conceitos. “Para além das questões que a tecnologia carrega, qual é o nosso papel diante de um ecossistema que está à beira de um colapso? Muitos cientistas já atestam que isso é irreversível. Estamos fadados a extinção”, alerta.
O artista prossegue, lembrando que teóricos e filósofos criaram o termo “antropoceno”, definidor de uma época geológica resultante do impacto que os seres humanos provocam no Planeta. “A palavra ‘Antropobsceno, que inventei, remete justamente ao causador de tudo isso, a nossa espécie. O antropo é o ser humano entendido desse lugar falho, que se considera uma espécie dominante na Terra, sem qualquer apreciação e respeito ao ecossistema. De que ponto de vista nossa espécie é, de fato, a mais inteligente? Tudo isso está sendo colocado em xeque hoje”, resume Velazquez.